quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Tempos Modernos...




Tempos Modernos...

O filme de Chaplin mostra o relógio logo de início. Carneiros andando amontoados, como indo para o abatedouro. Muitos homens entrando na fábrica.

Reprodução em série de um interesse que não nasce na consciência daquele que produz. Por isso o trabalho é alienado, e o tempo é medido pela contagem da reprodução.

O ritmo da existência é condicionado pelo da máquina que domina. A crítica de Chaplin nos remete assim ao modelo de fabricação consolidado com a Revolução Industrial.

É possível também relacionar o tempo da produção com a alienação da consciência do trabalhador, que se vê submetido ao completo abandono de si mesmo, como mero reprodutor de um sistema de reprodução mecânico.

A transformação da natureza escraviza em vez de libertar o ser humano, posto que compreende a própria natureza sob o olhar de quem detém o controle matemático sobre o objeto. A máquina, como expressão da tecnologia aplicada no âmbito da produção, revela o encantamento do homo faber pelo domínio e, ao mesmo tempo, o mantém preso à sua própria criação.

As longas jornadas de trabalho, o enlouquecido ritmo da máquina, que enfraquece o tempo primordial da vida pelo encantamento da técnica e de seu progressivo uso na exploração do homem pela máquina...

Os passos dados desde a saída de casa até a chegada na fábrica servem para ilustrar que o condicionamento ao mecanismo de dominação sobrevive pela necessidade da sobrevivência e pelo vínculo da sedução ilusória, internalizada pelo trabalhador, em garantir alguma espécie de patrimônio particular ou familiar.

Estes são sintomas do homem que adoece modernamente e que nos podem fornecer alguns elementos capazes de oferecer um debate substancial dentro dos pilares do modo de produção capitalista, a saber: produção, distribuição e consumo de mercadorias.

O que é produzido? Como é distribuído? A que público se destina o produto final da produção em massa?

Pensar o enfoque sociológico destes novos tempos, e suas implicações políticas, econômicas e culturais, pode traduzir nova compreensão sobre o processo de produção na sociedade capitalista.

Esta seria, portanto, uma pista possível, dentre outras, para a leitura deste clássico de Chaplin.


Jorge Leão
Professor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão

Em: 30 de setembro de 2009

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Formar, informar, deformar...

Uma reflexão sobre a formação de nossos professores de filosofia.
Abraços fraternos,
Jorge Leão

Formar, informar, deformar...

No âmbito educacional, a filosofia encontra o desafio de formar o ser humano em sua integral perspectiva. No entanto, a realidade pedagógica em que nos situamos, traz desafios que impedem a concreta efetivação deste processo.

Primeiro, no aspecto de nossos cursos regulares de filosofia, de um modo geral, o aspecto informativo (as diversas doutrinas, sistemas e teorias da história da filosofia) se sobrepõe ao elemento formador, enquanto processo de diálogo permanente com os problemas levantados e sua amplitude contextual, sobretudo às vivências e inferências do leitor, aprendiz, educando...

Da retomada dos assuntos apresentados no período em que nos “formamos” ao encontro com os alunos em sala de aula, novas lacunas se abrem, não apenas pela deficiência de informações ao longo de nossa frágil formação, mas na completa ausência de ligação entre os dados históricos e o cenário concreto da escola em que se encontram os professores de filosofia.

A experiência filosófica implica em possibilidades que nos remetem à questão: por que ensinar filosofia? A relação, desse modo, é de um profundo significado político, existencial e estético. Ora, se a informação não possibilita uma reformulação de nosso código lingüístico academicista, então toda a estratégia de se inserir a filosofia como disciplina curricular encontra-se esvaziada.É assim que nos colocamos diante da informação que recebemos e da que iremos transmitir.

Enquanto professores, não podemos confundir as instâncias do saber, mediado pelo pensamento vivo na experiência do ensino, com as estruturas massificadas do repasse burocrático de uma informação destituída de sentido, o que seria apenas perder de vista a unidade entre saber e ressignificar a história da filosofia por meio de sua inserção na realidade da sala de aula.

Retomando o conceito de práxis, a mediação do pensamento com a realidade cotidiana e vivencial torna-se elemento fundamental do ensino, enquanto formação básica do professor. A tarefa está, pois, em redimensionar o ensino tendo como eixo orientador a crítica auto-avaliativa da ação pedagógica, posto que “a reflexão crítica adquire sentido ao transformar-se em práxis” (GHEDIN, 2008).

Assim, retomamos aspectos considerados básicos para a formação do professor de filosofia, a saber: o que ensinar em filosofia? Isto é, qual é a especificidade do conhecimento filosófico? Em que sentido esse conhecimento contribui para a formação humana?

Outro elemento que deve figurar com clareza a perspectiva pedagógica do professor de filosofia é sobre por que ensinar filosofia? O que nos motiva como professores ao processo de ensino? Neste âmbito, reconhecemos tocar uma questão polêmica, e, ao mesmo tempo, crucial, haja vista a ausência de elementos claros sobre as razões de a filosofia estar ou não assumindo uma condição de disciplina no currículo do ensino médio brasileiro.

A academia ainda encontra-se, muitas vezes, fechada em sua proposta curricular, inclusive quando se oferta cursos de licenciatura em que a produção de debates sobre o tema encontra-se sufocado pela postura enciclopedista, delimitada, como se sabe, ao âmbito da história da filosofia.

Direcionado ao trabalho do professor na escola, um curso de formação de professores de filosofia deve necessariamente saber qual a realidade do ensino médio brasileiro. A completa distância e por conseqüência o afastamento da escola levam o estudante de filosofia a não saber, de fato, para quem ele vai falar. Assim, os mais terríveis absurdos metodológicos são realizados em sala de aula, por conta de um completo desconhecimento sobre a teoria da aprendizagem, o processo de conhecimento e a psicologia da adolescência, que deveriam constar em nossos cursos de licenciatura em filosofia.

Por isso, como ensinar a filosofia para o público do ensino médio, se não houve o preparo teórico, a fim de estabelecer critérios epistemológicos, éticos e didáticos para o desempenho da relação do professor em sala de aula? O desafio é presente no aspecto de que, caso não ocorra o cuidado específico com a mediação da palavra e do processo de ensino, o professor de filosofia trará para a escola a deformação da problemática do ensino filosófico, pois fatalmente cairá no hermetismo conceitual ou no ativismo das habilidades e competências, destituído de fundamentação e do trabalho dos conteúdos filosóficos necessários para o ensino médio.

Assim, o que cabe à formação de um professor de filosofia? Esta pergunta diz respeito ao problema central que se impõe a todos nós, ou seja, qual é, na verdade, o papel da filosofia na sociedade contemporânea? Investigar o cerne desta questão constitui descortinar o papel social do professor, enquanto elemento político de fundamental importância para a construção de um espaço de produção de conhecimento, que deve ser a escola.

O debate entre os grupos de professores na academia sobre o ensino e a sua conseqüente reflexão e autocrítica promove o fortalecimento da prática reflexiva em filosofia. Por isso, é necessário priorizar o entendimento de uma formação em processo de construção permanente, em que a história da filosofia, o programa a ser pensado, a concepção de avaliação, os aspectos metodológicos, traduzam, mediante uma práxis transformadora, o papel de nosso agir enquanto professores de filosofia.

Que filosofia? Que formação? Apenas informação, sem formação problematizadora, poderá nos conduzir a uma deformação de nossos estudantes, futuros professores e dos alunos que receberão os impactos desta “filosofia”, formando, informando ou deformando...


REFERÊNCIAS

- GHEDIN, Evandro. Ensino de Filosofia no Ensino Médio. SP: Cortez, 2008.

- VASQUEZ, Adolfo S. Filosofia da práxis. RJ: Paz e Terra, 1991.

Sobre as razões da filosofia

Sobre as razões da filosofia

O estudo da filosofia em geral pressupõe uma fundamentação de base epistemológia (sobre os fundamentos do conhecimento e seus modos de apreensão e suas relações com a ciencia), antropológica (pois implica em uma concepção de homem) e política (na medida em que o espaço público é construído pela consciencia e liberdade de seres co-responsáveis).

Neste aspecto, temos assim elementos definidores de uma relação formadora da filosofia, ligando-se aos aspectos educativos, enquanto formação integral do ser humano.Vale ressaltar que a educação não se delimita a um sistema de códigos ou informações a serem transmitidas, muito menos a um domínio da análise intelectual sobre uma parte delimitada da experiência humana no mundo, como faz a ciência.A idéia de uma instrução pedagógica tem sido dominante, quando se associa a compreensão de uma escola que se delimita ao ensino de uma ciência específica.

Por isso, não se pode confundir educação com instrução (para isso, uma excelente referência é "A Educação do Homem Integral", do filósofo e educador brasileiro Huberto Rohden). Assim, a educação deve nos dizer muito mais do que uma simples adequação a uma sistema de códigos, normas de conduta, notas, ou de qualquer processo de "formação" (melhor dizer, informação) que venhamos a ter ou adquirir ao longo da existência.

Outro referencial é ver a concepção de educação em Platão, uma vez que para este pensador a filosofia, enquanto conhecimento que conduz a alma ao mundo inteligível - a Idéia do Bem), deve constituir o pressuposto teórico do agir político.

Seguindo a marcha histórica, encontraremos a hipertrofia da intelecção, em detrimento da formação ética e da sensibilidade estética. Deve-se, portanto, pensar atualmente sobre as razões da filosofia, a fim de restituir o aspecto de uma formação integral para a educação.

Abraços fraternos a todos,
Jorge Leão

domingo, 14 de junho de 2009

O estar sendo na travessia

Um breve ensaio sobre dois textos "travessos", de dois grandes autores que abrem outros afluentes no percurso de nossa travessia humana, "demasiada humana",
abraços quixotescos, na abertura de mais veredas...
Jorge Leão

O estar sendo na travessia

Jorge Antônio Soares Leão[1]

O caminho que se descortina em “Assim Falou Zaratustra” (1883) coloca o destino humano diante de coisas perigosas.

Inicia-se a jornada do “além-do-homem”, aquele que se dirige para a afirmação da vida, na fecundidade de sua vontade, que é o poder de criar e re-criar a si mesma a todo instante.

O homem é um estar-sendo, no espaço de uma trajetória em que a arte da vida é tecida pelo fecundo trabalho da vontade. Não há objetividade duradoura que dê conta da poesia do Zaratustra, por isso ele acena a vontade de afirmar a vida como o traço distintivo de sua escalada em relação ao código moral do discurso metafísico e do caráter doutrinário da religião cristã.

Por isso, no Prólogo, Nietzsche considera que:

“O homem é uma corda estendida entre o animal e o além-do-homem – uma corda sobre um abismo.
É o perigo de transpô-lo, o perigo de estar a caminho, o perigo de olhar para trás, o perigo de tremer e parar.
O que há de grande, no homem, é ser ponte, e não meta: o que pode amar-se, no homem, é ser uma transição e um ocaso.” (p. 31)

Em “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa (1908-1967), a saga do jagunço Riobaldo expõe também um percurso afirmativo, que é a descoberta do sertão enquanto travessia. O destino de Riobaldo é um estado de vir a ser no caminho que se impõe ao drama localizado do homem sertanejo.

Em Riobaldo, o sertão está em todo lugar, pois o “sertão é travessia”. Esta descoberta, assim como em Nietzsche, não é algo conceitual, do ponto de vista de uma ordem metafísica do real, uma vez que a poética do sertão constitui um estar sendo sem limites ou definições, apenas o horizonte e o mistério das veredas que surgem como caminho.

Uma passagem que ilustra este percurso existencial é quando Guimarães Rosa expõe o pensamento do sertanejo sobre a realidade:

“O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia” ( GS:V, p. 80).

A travessia é, com isso, destituída de estabilidade. Não há uma ordem “a priori” no viver do sertanejo, pois a vida não se encaixa em nenhuma definição, em nenhum fundamento absoluto, pois, para Riobaldo, “viver é um descuido prosseguido” (Idem, p. 86). Isto é, no drama fecundo do viver, nasce a trilha das veredas que se vivenciam a cada instante, a cada novo confronto, a cada nova partilha de amizade e de amor com seu companheiro Reinaldo, depois revelado como Diadorim. (Cf. GS:V, p. 172)

Em Nietzsche, encontra-se novamente o drama da vida em termos de uma não garantia objetiva, o que nem a filosofia enquanto metafísica, nem a religião e mesmo a ciência conseguiram delimitar. Em “A Gaia Ciência” (Livro III, § 121, p. 186), Nietzsche considera acerca da vida:

“A vida não é argumento – Armamos para nós um mundo, em que podemos viver – ao admitirmos corpos, linhas, superfícies, causas e efeitos, movimento e repouso, forma e conteúdo: sem esses artigos de fé ninguém toleraria agora viver! Mas com isso ainda não são nada de demonstrado. A vida não é argumento; entre as condições da vida poderia estar o erro”.

Aspecto percebido também em Riobaldo, quando este nos diz que:

“(...) a vida não é entendível”... (Idem, p. 156).


Desse modo, a trajetória de Riobaldo assemelha-se ao abandonar-se espontâneo da criança do Zaratustra, ou da terceira transformação passada pelo além-do-homem em seu afirmar-se enquanto vontade de poder (Cf. AFZ, Das três metamorfoses, pp. 43-45). Com efeito, na inocência da criança, descobre-se um rio de possibilidades, como na travessia de Riobaldo e seu amigo Reinaldo, na imensidão do São Francisco.

Enquanto o Zaratustra vê na criança a descoberta de um sagrado “sim” ao espírito que “quer a sua vontade” (AFZ, p. 45), Riobaldo relembra da travessia como vida que se irrompe nas águas do São Francisco e se faz descobrir pelo medo e pela confiança do amigo também em travessia. “Viver é muito perigoso”, é a afirmação de Riobaldo em diversas passagens de “Grande Sertão: Veredas”. Como se mistério desvendado na tessitura poética da passagem, do estar sendo em travessia.

Nesta travessia, deslocada do ritmo acumulativo de uma percepção fragmentada, não há espaços para contagens, pois a memória é um passar momentâneo repleto de significados. Por isso, para Riobaldo “um rio é sempre sem antigüidade” (GS:V, p. 162), uma vez que o presente que se apresenta é o sertão enquanto passo descontínuo, ilustrado pela própria estrutura da obra organizada singularmente por Guimarães Rosa, sem divisões, apenas o relato ardente de uma memória recheada de solidão, medo, conflitos, amor e fecundidade poético-filosófica, vivificada pela relação com a vida desconexa, sem entendimento, no sertão apenas, que sonda a própria vida em suas veredas.

Duas passagens bem ilustram o sertão para Riobaldo, quando lemos:

“Esta vida é de cabeça-para-baixo, ninguém pode medir suas perdas e colheitas” (GS:V, p. 161), e ainda quando é afirmado:

“Sertão é isto, o senhor sabe: tudo incerto, tudo certo” (Idem, p. 172).

Assim, a travessia, em seu destino trágico para Nietzsche, e em seu estar sendo Riobaldo, em Guimarães Rosa, perfaz a relação de uma dança, que nem mesmo o próprio homem é capaz de abarcar, uma vez que ele está só no percurso, e necessita ardentemente da alegria e do êxtase da descoberta da criança, em Zaratustra, e de seu amor por Diadorim, em Riobaldo.

Este traço de incertezas, longe de amortizar a queda, abre novos labirintos:

“Fui eu? Fui e não fui. Não fui! – porque não sou, não quero ser. Deus esteja!” (Ibidem, p. 232).

Pois a vida é algo incerto, “como a vida é cheia de passagens emendadas” (Idem, p. 235).

E ainda, refazendo o traço espontâneo da criança nietzschiana:

“O que eu queria era ser menino, mas agora, naquela hora, se eu pudesse” (Idem, p. 260).

Mais uma vez, aproximando-se da passagem de Riobaldo pelo sertão, surge a fala poética de Zaratustra, apresentando-nos a suprema vontade, a sua virtude por excelência, a suprema esperança do filósofo peregrino, diante de mil possibilidades no curso da existência criadora:

“Mil caminhos existem, que ainda não foram palmilhados, mil saúdes e ocultas ilhas da vida. Ainda não esgotados nem descobertos continuam o homem e a terra dos homens.

Quedai-vos vigilantes e à escuta, ó solitários! Chegam ventos, do futuro, com misterioso bater de asas; e trazem boa nova aos ouvidos finos.

(...)

Em verdade, um lugar de cura ainda deverá tornar-se a terra! E já a envolve um novo cheiro, um cheiro salutífero – e uma nova esperança.” (AFZ, p. 91)

Por isso, o supremo risco da vida é o não conformar-se com o medo da travessia, é mergulhar e atravessar o rio, aceitando os perigos e ousando vencer os desafios. É como estar em processo de cura, afirmando a condição de plenitude da vida, embora experimentando o drama da dor.

No Livro V, de “AGaia Ciência”, complemento datado de 1886, Nietzsche traz como subtítulo: “Nós, os Sem-Medo”, afirmando no parágrafo 380:

“É preciso ser muito leve para levar sua vontade de conhecimento até uma tal distância e como que para além de seu tempo, para se criar olhos para a supervisão de milênios e ainda por cima céu puro nesses olhos! (...) O homem de um tal além, que quer discernir as mais altas medidas de valor de seu tempo, precisa, para isso, primeiramente “superar” em si mesmo esse tempo” (AGC, p. 296).

Riobaldo, ao segredar a sua travessia ao leitor, o homem de saber apurado e fina instrução acadêmica, ilustra muito bem a leveza pretendida por Nietzsche na passagem anterior, uma vez que a travessia é uma narrativa de si mesmo sobre o sertão, dentro e fora de Riobaldo, não um código de receitas prefixado na ordem determinista do sol escaldante do sertão.

A vida é feita na travessia, por isso é como se Riobaldo estivesse em um drama sem horizontes determinados, em que a jagunçada inimiga pode estar dentro de seu próprio bando, ou guerreando com o diabo, que se apresenta como inimigo de Deus, mas que pode nem existir de fato, o que somente é revelado no término da obra.

Assim, nos diz Riobaldo:

“Vida, e guerra, é o que é: esses tontos movimentos, só o contrário do que assim não seja. Mas, para mim, o que vale é o que está por baixo ou por cima – o que parece longe e está perto, ou o que está perto e parece longe. Conto ao senhor é o que eu sei e o senhor não sabe; mas principal quero contar é o que eu não sei se sei, e que pode ser que o senhor saiba”. (GS:V, p. 245).

Nestes mundos possíveis, inúmeras veredas se descortinam aos nossos olhos. O amor, a guerra, a fecundidade da vida. Riobaldo atravessando o rio São Francisco, o filósofo do sertão. Zaratustra, por sua vez, em busca dos ares rarefeitos nas montanhas, abandona a planície, depois a ela retorna, para anunciar a suprema alegria da vontade afirmativa da vida.

Por isso, o laço que transforma. renova e revigora os personagens de Nietzsche e Guimarães Rosa é a vida em travessia. Nada é maior que o supremo risco desta passagem, pois é “preciso mais coragem para pôr fim à vida do que para dar começo a um novo verso: sabem-no todos os médicos e poetas”. (AFZ, p. 213).



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

CORDEIRO, Robson Costa. O Sertão de Riobaldo: uma leitura a partir de Nietzsche, in: Revista Trágica – 1º semestre de 2008, nº 1 pp. 97-105.

NIETZSCHE, F. Assim Falou Zaratustra. Um livro para todos e para ninguém. 8. ed. Tradução de Mário da Silva. RJ: Bertrand Brasil, 1995.

______. Coleção Os Pensadores. SP: Nova Cultural, 2005.

ROSA, Guimarães. Grande Sertão: Veredas. 19. ed. RJ: Nova Fronteira, 2001.




[1] Professor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão

segunda-feira, 30 de março de 2009

Os fundamentos filosóficos e as implicações sociológicas do conceito de saúde

Amigos e amigas da sabedoria,
uma breve reflexão sobre a relação necessária entre filosofia e sociologia e alimentação, saúde, qualidade de vida, longevidade...
abraços fraternos,
Jorge Leão

Os fundamentos filosóficos e as implicações sociológicas do conceito de saúde

Inicialmente, precisamos afirmar que este conceito deve ser ligado ao campo holístico, pois não podemos admitir uma medicina que não pense uma antropologia filosófica, de fundo pitagórico, integral, admitindo a tríade corpo, mente e espírito. Infelizmente, grande parte dos médicos, ou melhor, dos técnicos em medicina (ser médico é outra coisa, pois implica no conhecimento de uma visão holística de ser humano, tal como propugnava Pitágoras e sua escola), desconhece a visão integrativa, o que impede de que hoje tenhamos uma abordagem natural da cura e das próprias doenças.

O propósito de compreender a saúde em sua relação direta com a cura pode parecer uma atividade pequena, quando se trata de encher o corpo de remédios que não vão a causa do problema, e pode parecer perda de tempo, para um sistema de doença que pensa cada vez mais em moldes paliativos. Por isso, é tão necessário hoje entender o corpo em sua relação de equilíbrio com a mente e com a dimensão espiritual, não como doutrina religiosa, mas como caminho de iniciação, o que parece um absurdo para quem vem de uma formação acadêmica com base no tratamento analítico quantitativo, como faz a medicina tradicional, de caráter alopático.

A filosofia, enquanto espaço de busca radical por um sentido para o pensar e o agir humanos, situa esta discussão no âmbito do processo de redimensionar o indivíduo, em sua relação com o mundo e com os outros, a dimensão ética da alteridade. Não se pode, desse modo, hoje admitir um ministério da saúde desvinculado do ministério da educação, o que me parece um dos graves equívocos dos sistemas de "saúde" e de "educação" que, tradicionalmente, os indivíduos estão sujeitos ao longo da vida em nossa sociedade.

Em termos sociológicos, a saúde precisa ser abordada a partir de uma política de ação planejada por meio de uma compreensão preventiva, uma vez que os gastos públicos a nível mundial hoje retratam a falência da medicina sintomática, aplaudindo o sistema privado dos “planos de doença”, quando de sua "retomada" do poder de gerenciar os problemas enfrentados a nível social, quando o tema é "saúde publica". Isto claramente nos remete ao cerne da questão. Sabe-se que construir hospitais não toca na causa do problema, assim como construir presídios não elimina a ausência da verdadeira educação e a marginalização social imposta a grande parcela da população, excluída das condições necessárias para o desenvolvimento social de uma dignidade humana. Soa como cinismo público você admitir que o efeito de uma causa é combatido por um efeito maior que o efeito anterior; ora, se a causa não for atingida, outros efeitos mais bombásticos virão, certamente.

Assim ocorre com a saúde, se a freqüência de nossos batimentos cardíacos não diz respeito à alimentação que temos e ao nível de vida irracional que levamos nas cidades poluídas que vivemos, pode-se prever a quantidade de dinheiro que o erário público irá depositar na conta dos grandes empresários ligados a indústria dos remédios. Por isso trata-se de um tema médico, pois de caráter antropológico, filosófico, sociológico e ecológico. Ter saúde não é apenas aparentar um corpo saudável, mas ter uma mente equilibrada e um propósito solidário de irmandade afetiva com a natureza e com os demais seres vivos. Ser saudável implica em admitir a unidade e o equilíbrio da natureza no corpo, para assim garantir que o espaço público seja também transparente e solidário.

Talvez a maior dificuldade não seja hoje em administrar a saúde, mas de compreender a necessidade de mudança de hábitos, o que é uma experiência anterior e mais profunda. Precisamos primeiro saber nos alimentar, para depois filosofar. Esse é o resultado prático para aquele que abre a porta do mistério e se vê inundado pela luz azul da harmonia e da saúde. Precisamos de médicos que atuem de modo preventivo, como sábios ouvintes da voz sempre terna da natureza.

JORGE LEÃO
Em 24 de março de 2009

terça-feira, 3 de março de 2009

O Enigma de Kaspar Hauser


O Enigma de Kaspar Hauser

O instigante filme “O Enigma de Kaspar Hauser” (ano de 1974), do cineasta alemão Werner Herzog, vencedor do Grande Prêmio do Júri, no festival de Cannes, em 1975, levanta para nós um tema filosófico polêmico, a saber: há uma racionalidade própria à natureza humana, ou ainda, é possível admitir uma natureza humana?

O drama do personagem, interpretado por Bruno S., que não era ator profissional, mas que trabalhou com muito esforço com o diretor alemão, é iniciado, mostrando-o sozinho, sentado, isolado, emitindo sons como de um animal, envolvendo um pano velho em um cavalo de brinquedo. Ele se encontra preso por um corrente, bebe água e come um pedaço de pão. É quando chega um homem vestido de preto, põe um banquinho à sua frente, entregando-lhe um papel e um lápis, forçando-o a escrever. Kaspar Hauser tenta segurar o lápis e escrever algo sozinho. Diante disso, levanta-se outra questão: já há no ser humano uma predisposição para a linguagem, em termos de uma ação consciente?

Em seguida, ele é carregado pelo homem, que o leva para o alto de um monte, pois o nosso personagem não sabe sequer andar. Com muita dificuldade, ele dá os primeiros passos. Aqui, fica explícito o entendimento de que o ambiente determina tanto aspectos físicos, quanto psico-sociais ao ser humano.

Algumas fotografias expõem de modo simples e belo os campos, os telhados, o relógio, a vila, imagens que refletem a mente obscura de um ser isolado, e que agora precisa urgentemente descobrir o mundo. O homem de preto vai-se, e Kaspar Hauser permanece imóvel no meio da praça com uma carta na mão, sendo observado pelos moradores, até que alguém pergunta a ele aonde quer ir, e se pode ajudá-lo, entregando a carta que segura a seu destinatário. O capitão da cavalaria, a quem foi destinada a carta, lê a história daquele rapaz com aspecto de uma criatura abandonada, isolado do convívio social. Não é possível extrair nada dele, como num interrogatório policial. Ele não fala e nem reage às perguntas. O único sinal é o seu nome, que é assinado no papel dado a ele. Resolvem, por isso, isolá-lo em uma cela, dizendo que devem enquadrá-lo nas normas legais, ainda que não parecesse ser ele um vândalo, dizem os guardas, que depois o levam para a casa de um dos moradores da vila.

Lá, o nosso enigmático personagem tem contato com uma família muito caridosa, que ensina a ele os hábitos sociais básicos, como sentar-se a mesa, pronunciar as palavras e frases, aprender a relacionar-se com o mundo a sua volta, ao tentar memorizar um poema ensinado pela filha do guarda da prisão e dono da casa, ou ao brincar com um passarinho, dando-lhe alimento. Ele ainda é capaz de se emocionar com uma criança nos braços, dizendo: “Mãe, sou desprezado por todos”, depois de ser motivo de zombaria para um grupo de bêbados arruaceiros.

Os oportunistas que o vigiam levam-no para o circo, a fim de tirar proveito de interesse público, como a grande atração. De lá ele passa a morar na casa do Sr. Daumer, um sujeito que assistia ao espetáculo circense, e que lhe dá todas as condições para que, enfim, seja despertada nele a potencialidade de socialização.

Ao ouvir o piano, já na casa do Sr. Daumer, ele diz: “Soa forte no meu peito a música. Estou muito velho? Por que tudo é tão difícil para mim? Por que não posso tocar piano como respiro?”... O Sr. Daumer responde a ele que, passados dois anos de convívio, ele já aprendera muita coisa, mas que ainda deve aprender tudo, pois nunca estivera entre os homens antes. Ao que Kaspar Hauser responde: “Para mim os homens são como os lobos”. Aqui, percebemos que, ao ter o domínio da linguagem, o personagem começa a colocar uma dúvida sobre a sua suposta “pureza”, como se essa denotasse uma impossibilidade de análise mais depurada da realidade. O que parece aqui ser ponto para reflexão é: a dita “civilização moderna” não delimita o poder de criticidade do homem, quando de seu processo de socialização?...

A própria existência de Deus é levada por dois teólogos a Kaspar Hauser, com o objetivo de doutriná-lo. “Já tinha alguma idéia de Deus?”, pergunta um dos teólogos. Ele apenas responde: “No cativeiro eu não pensava em nada, e não consigo imaginar que Deus do nada criou tudo, como vocês me disseram”. Um dos teólogos retruca imediatamente: “Deve admitir o mistério da fé sem procurar entender”. Mas, sabiamente, responde Kaspar Hauser: “Primeiro, preciso aprender a ler e a escrever melhor para compreender o resto”...

Vê-se que são questões polêmicas, agora situadas no contexto de uma possível resposta crítica a ser dada pelo personagem, como se o mesmo tivesse agora que lutar contra um sistema de códigos lingüísticos, ideológicos, estéticos, lógicos, teológicos, morais, prontos para extrair de sua mente uma resposta pronta e acabada. Duas cenas são marcantes para ilustrar esse embate: a primeira, em que Kaspar Hauser pergunta à governanta do Sr. Daumer: “para que servem as mulheres, e por que só lhe permitem cozinhar e fazer crochê?”, ao que ela desconversa e pede que isso seja perguntado ao Sr. Daumer; a segunda, quando um professor de lógica lança uma situação problema de caráter lógico dedutivo, dizendo que só há um modo de respondê-la, e depois da demonstração do professor, Kaspar Hauser apresenta outra possibilidade de resposta, o que, obviamente, não é aceito pelo ortodoxo professor. Pessoas como Kaspar Hauser são nessas horas consideradas loucas e inoportunas...

Com isso, o convívio social torna-se uma tortura para o nosso personagem. Numa recepção nobre, na casa de um conde inglês, ele se sente mal e sai, depois de expressar no piano o que sentia em sua alma através da valsa em Fá Maior, de Mozart. Em seguida, ele sai correndo da igreja, dizendo que a canção dos fiéis soa em seus ouvidos como um grito horrível. Fica aqui explícita a idéia de que não há enquadramento possível para Kaspar Hauser, capaz de satisfazer a sua busca interior. É quando ele é agredido em sua casa, com duas pauladas na cabeça. Ele parecia incomodar algumas pessoas. A sua indiferença aos padrões. O seu jeito “anti-social”. Mas faltava uma coisa a ser dita por ele. É quando ele tem uma visão profética. “Eu vi o mar. Eu vi uma montanha, e muita gente. Estavam todos subindo a montanha, como uma procissão. Havia muita neblina. Eu não conseguiria enxergar claramente. E lá em cima, estava a morte”.

Depois de recuperar-se, ocorre outro atentado, agora para conduzi-lo de vez à morte. Nos momentos derradeiros, já no leito de morte, Kaspar Hauser conta a sua última história. “Vejo uma caravana que vem pelo deserto atravessando a areia, guiada por um velho cego. A caravana parou, alguns acreditam que eles se perderam, pois se depararam com as montanhas. Eles não conseguem seguir a bússola. Então o guia cego pega um punhado de areia e a come, como se fosse uma comida. ‘Meus filhos’, diz o cego, vocês estão errados, isto diante de nós não são montanhas, e sim , apenas sua imaginação. Prosseguiremos para o norte’. E então, sem discutirem, eles prosseguiram adiante e chegaram na cidade. E lá a história continua. Mas a história nesta cidade, eu não sei. Eu agradeço por terem ouvida minha história. Estou cansado agora”...

Kaspar Hauser morre, e é logo autopsiado. Os médicos legistas examinam o seu cérebro e percebem uma deformidade, o seu lado esquerdo é menor. Isso dará um lindo processo investigativo. O escrivão, que relata o drama de Kaspar Hauser desde o seu início, afirma: “Finalmente temos a melhor explicação que podíamos achar sobre este estranho personagem”. Uma fala que nada mais representa do que a tentativa de justificar a ineficaz condução social dada pelos anos de não adaptação de Kaspar Hauser a um sistema ideológico alicerçado na burocracia das normas prescritas, segundo modelos fixos de padronização sócio-cultural.

Observa-se desse modo que é mais cômodo colocar a culpa da não sociabilidade do personagem a algum fator fisiológico, do que mergulhar fundo na questão antropológica da vida social e seus desdobramentos nem sempre logicamente demonstráveis e cientificamente comprováveis. Não estaria o filme de Herzog levantando outra possibilidade de responder à polêmica acerca de uma natureza pura do homem ou de uma racionalidade inata, que também necessitaria, para ser melhor compreendida, de afetividade, imaginação, criatividade e amor? Fica para nós a reflexão, em tons de polêmica e controvérsias...

Jorge Leão
Professor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão, e membro do Movimento Familiar Cristão
Em: 03 de março de 2009

domingo, 1 de março de 2009

A liberdade

Amigos e amigas da sabedoria,
aí vai um texto sobre esse tema instigante para a filosofia, e é trabalhado no tópico Introdução ao estudo da Ética,
abraços quixotescos,

Jorge Leão

A liberdade

As gaiolas estão agora vazias. Todos os pássaros que nela estavam se foram... Agora estão gozando de ventos, fortes ou fracos, voando por sobre as cabeças daqueles que um dia os escravizaram. ..Seria um sonho, essa tal liberdade? Confundir-se- ia com a libertação de algo ou de alguém? Exigiria um abrir drástico de tantas e tantas gaiolas que insistem em permanecerem fechadas?

Perguntas e perguntas...

Todas em vão...Qual o sentido de tais desejos, se deles não pudéssemos extrair algo de real e participante em nosso tato? Tato, por vezes, tão insensível... Insensibilidade e o seu avesso, talvez sejam estes os grilhões que nos aprisionam ou queiram carnalmente nos humanizar... Sensibilidade dos santos, que viram ser possível o sonho de suas mais remotas esperanças, liberdade em sentido vital, por isso, lançaram-se tão misteriosamente aos braços do Divino Senhor... Sensibilidade aos apelos das calçadas... Liberdade da escuta e do serviço... Se somos realmente livres, como nos limitarmos às imposições dos dogmas da escravidão social?

Perguntas e perguntas...

As gaiolas estão agora vazias... Restam a água e um pouco de alpiste; e o essencial, ao nosso mesquinho odor de liberdade, o pássaro? Não está mais ali, fechado, resumido, limitado... Venceu a frieza do túmulo, levantou-se. .. afastou a pedra do sepulcro, voou simplesmente! E agora?...

Perguntas...

Eu estaria em paz vendo todos os pássaros voando... Todas as crianças brincando, sorrindo e correndo... Todas as mesas fartas de pão e de amor... Vendo cada poema de caridade sendo levado aos altares abençoados todos pelo desejo visceral do Pai de todas as liberdades. Enquanto não chega esse tempo, sinto-me cada vez mais prisioneiro de todas as liberdades, manifestando o irrequieto ardor de ir à busca do concreto das respostas.

Respostas concretas...

Liberdade vivida a cada passo, a cada pulsação, a cada respirar... Liberdade que canta o canto de Francisco de Assis... Liberdade que não se cansa de abrir as portas das gaiolas, deixando-as ulteriormente repletas de teias de aranha... Liberdade que nasce na terra e continua no céu... Respostas concretas... Liberdade viva... Assim, creio que minhas dúvidas e perguntas não sejam em vão ou se tornem vãs, esquecidas pela escravidão do tempo.

Jorge Leão
Em: 31 de janeiro de 1997.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Sobre os riscos dos "fast-foods"

Para reflexão dos amigos da sabedoria...

Sobre os riscos dos “fast-foods”

“Não há tempo para perder, preciso comer um lanche rápido, um “fast-food”, estou com pressa”... Essa declaração aparentemente banal retrata o ritmo de muita gente nas grandes cidades. Enquanto isso, o corpo adoece silenciosamente, e mais tarde aparecem as ditas “doenças crônicas”, que a medicina declara que não há cura, mas só tratamento.. .

Indubitavelmente, existe hoje uma indústria da doença, que anda de mãos dadas com a indústria farmacêutica dos remédios. Os mesmos remédios, atolados de química, que não vão à causa dos problemas, mas apenas retardam a proliferação dos sintomas já existentes no corpo. Se houvesse um real inteiro de grande parte dos médicos com a saúde, e tudo que essa palavra implica, não haveria tanta morte e dor por um lado, e tanta gente enriquecendo com a fábrica das doenças por outro.

Ora, como se sabe, grande parte das doenças consideradas “incuráveis” pela moderna medicina nascem de desequilíbrios na alimentação e na vida urbana pobre de experiências de paz, espiritualidade e beleza.Um exemplo claro disso são os ditos “fast-foods”, como aqueles que se encontram no McDonald´s e Bobs da vida, com alto teor de gorduras, corantes e substâncias químicas as mais nocivas. "O risco - dizem os mais céticos - pode até vir, mas só daqui a alguns anos; então por que se preocupar agora, o bom mesmo é desfrutar de um bom hamburger, com batatas fritas e uma Coca-Cola bem gelada"...

E com esse descrédito, a nossa péssima conduta alimentar, com o passar dos anos, se encarrega de depositar no sangue o acúmulo de impurezas e toxinas que nós mesmos jogamos cotidianamente em todo o organismo. A grande interrogação que é gerada com tudo isso é: se sabemos dos malefícios de uma alimentação desequilibrada, por que não mudamos nossos hábitos alimentares? ...

Pesquisas recentes comprovam o aumento acelerado de câncer no estômago e intestinos, órgãos que são agredidos todos os dias com a nossa pressa e gula. O pior é que a indústria do alimento enlatado vende uma propaganda sedutora do prazer por um paladar irresistível, contrariando a facilidade de encontrar nas frutas e nos legumes um prazer que não se delimita apenas a boca, mas é capaz de prevenir e curar inúmeras doenças.

Muito do que padecemos hoje é fruto dessa falsa imagem de que precisamos comer carne e encher o estômago para saciar a fome. Os nutricionistas hoje recomendam refeições de três em três horas, em quantidades menores, alternando as grandes refeições (preferencialmente na parte da manhã) com o uso de frutas. Medidas como essas mudam a abordagem do conceito de saúde e de doença, pois o corpo passa a responder rapidamente ao tratamento que damos a ele, seja de cuidado ou de descaso...

Assim, o que se compreende por saúde aqui é a percepção que nós temos de nossa alimentação, e que deve ser acompanhada de um equilíbrio espiritual e mental. A alimentação natural, ou pelo menos o mais próximo possível disso, não é algo desconectado, mas integrado, pois quem sabe o porquê de uma alimentação natural, pode certamente ser instrumento de um mundo mais belo, mais pacífico, mais justo.

Como já sabemos, o impacto da matança de animais no planeta é ecológico, pois desmata milhares de quilômetros de floresta para criar bois que vão ser massacrados no matadouro para satisfazer um prazer mesquinho que não dura às vezes dez minutos, como é o caso de um hambúrger que precisa ao equivalente de seis metros de mata fechada para produzir o efeito final de sua produção.

É uma violência que nós não precisamos ser cúmplices. O planeta agradece, nosso estômago também.As pequenas mudanças causam impactos planetários.

Podemos começar hoje mesmo a grande revolução por um mundo melhor. Está em nossas mãos e em nossa mente a escolha.

Abraços fraternos,

Jorge LeãoProfessor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão e membro do Movimento Familiar Cristão

Em: 18 de fevereiro de 2009

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Um comentário sobre o espetacular "Nuovo Cinema Paradiso"


Um comentário sobre o espetacular "Nuovo Cinema Paradiso"


Filme italiano, lançado no ano de 1988, “Nuovo Cinema Paradiso” recebeu o Oscar de melhor filme estrangeiro e o Globo de Ouro em 1990, assim como o Grande Prêmio do Júri, no Festival de Cannes, em 1989. Com enredo e direção de Giuseppe Tornatore, o filme retrata a trajetória de Salvatore di Vitto, na pequena cidade de Giancaldo, na Sicília, nos anos que antecederam a chegada da televisão, depois da Segunda Guerra Mundial.

Na cidade, a única diversão é o cinema, lá as pessoas se encontram, constroem romances, se emocionam com as histórias inesquecíveis dos filmes passados pelo projetista Alfredo (interpretado pelo ator Philippe Noiret), que conhece o menino Salvatore, conhecido por todos pelo apelido carinhoso de Totó (interpretado pelo talentoso Salvatore Cascio). O menino é apaixonado por cinema, e não deixa Alfredo sossegado até que este transmite a Totó o manejo da arte de projetar filmes. Ocorre, porém, um grave incêndio na sala de projeção, sendo que Alfredo é salvo pelo menino; no entanto, com o acidente, fica cego e nunca mais poderá ver os filmes, levando por isso Totó a assumir o cargo.

Quando adolescente, Totó apaixona-se por Elena (interpretada por Agnese Nano), o seu grande e eterno amor. A trama amorosa dura toda a sua vida, quando Salvatore retorna à terra natal depois de trinta anos, como um cineasta bem sucedido, para o enterro de seu grande amigo Alfredo. A sua volta é recheada de uma profunda nostalgia pelo passado, num tempo em que a cidade vivia seus momentos de alegria em função do Cinema Paradiso, que agora não era mais que ruínas e escombros. Rever o velho projetor, carinhosamente guardado em seu quarto por sua velha mãe, conversar com ela sobre coisas nunca ditas, voltar ao velho cinema abandonado, e lá encontrar as marcas de suas lembranças, desde o tempo de infância. Lembrar-se de seu grande amor, ao ver uma menina andando de vespa pelas ruas da cidade. Era como se Salvatore pudesse ver o rosto de Elena como há trinta anos. A semelhança era tamanha que Salvatore seguiu a menina por alguns dias, e descobriu seu endereço, confirmando sua suspeita, de que era mesma a filha de Elena.

O encontro com o passado trouxe em Salvatore a possibilidade de reviver uma grande paixão, o que ocorre de fato, mesmo que de modo passageiro. Elena (agora interpretada pela atriz Brigitte Fossey) tem o rosto envelhecido, mas o olhar penetrante de uma jovem adolescente esperando pelo grande momento de sua vida. A beira da praia era o lugar preferido de Salvatore, quando buscava a solidão. O encontro só podia mesmo ser lá. Elena o encontrou. A vida os aproximou de modo jamais previsto, embora que silenciosamente aguardado pelos dois. Era a possibilidade de viver o grande amor de suas vidas, ainda que efêmero. O amor de apenas uma noite, tão fugaz como a própria noite. O encontro aguardado durante tanto tempo, que deveria ter ocorrido há trinta anos, se não fosse a súbita mudança de planos na família de Elena em mudar-se de Giancaldo, e a opinião de Alfredo, que disse a Elena que tanto esforço talvez não valesse muito aos dois. O encontro na escuridão de uma noite que nunca mais voltaria enfim aconteceu...

Para Salvatore, algo tão maravilhoso deveria durar para sempre, mas Elena recusa-se a viver esse amor, falando de sua vida atual e de tudo o que a vida trouxe aos dois, depois de tantos anos. Salvatore deve retornar a Roma, cidade onde vive e que pôde construir uma carreira de fama e sucesso. Era preciso esquecer tudo mais uma vez, assim como Alfredo lhe dissera um dia, quando de sua partida da pequena Giancaldo.

Salvatore leva consigo o último presente deixado pelo velho amigo Alfredo e projeta em sua sala de cinema. Eram as cenas de beijo, cortadas pela censura do padre conservador da pequena cidade de Giancaldo. Todos os beijos censurados, agora livremente expostos graças à generosidade de Alfredo, que consegue ainda falar ao coração de Salvatore, por meio de cenas tão ansiosamente aguardadas pelos espectadores do Cinema Paradiso, e que somente ele, depois de longos anos, tem a oportunidade de vê-las.

A última cena é particularmente marcante, de uma beleza plástica indescritível, que emociona de modo a nos deixar embalar mais uma vez pela belíssima melodia de Andrea e Ennio Morricone, música que eternizou a trilha sonora do filme. A cena nos aproxima daqueles sinais de um tempo que retorna pelas imagens de um cinema repleto de pureza, sentimento e beleza. Era a época áurea do cinema italiano, e também de clássicos do cinema norte-americano, que marcaram definitivamente a memória do pequeno Totó, agora um cineasta famoso, sentado atonitamente diante de lembranças marcadas pelo vislumbramento de uma vida impossível de ser revivida, apenas recordada, mas, ainda assim, profundamente sentida. Cinema Paradiso é por tudo isso um filme para ser visto e revisto várias vezes, como os filmes do passado, passados na memória presente de Salvatore de Vitto e agora em nossas próprias recordações, revividas por meio da maravilhosa arte do cinema, que permitiu a tantos amores que se encontrassem e que também se fossem.

Jorge Leão
Professor de Filosofia do Instituto Federal do Maranhão e membro do Movimento Familiar Cristão

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Sobre o filme "A Vida é Bela"



A Vida é Bela!

A seguir a síntese do filme "A Vida é Bela", vencedor de 3 Oscars, (emocionante, comovente, humano, belo!) trabalhado no CEFET-MA em novembro de 2008, com os estudantes das turmas de Desing (2 ano) e de Eletrotécnica (1 ano), na disciplina de filosofia, tendo como fundamentação teórica o tema: valores, liberdade e Ética. O debate em sala possibilitou questões interessantes sobre os personagens, que no contexto do filme foram envolvidos num cenário de extrema ausência de liberdade e de perda da dignidade humana, os campos de concentração nazista durante a Segunda Grande Guerra. Contudo, a relação de amor entre Guido, sua amada Dora e seu filho Giosué é o ponto-chave do enredo. O amor é o que alimenta o sonho do pai em dar ao filho um presente (por ironia, um tanque de guerra), que certamente virá, se Giosué acreditar que é verdade. O sonho da liberdade, tantas vezes limitado por condições inóspitas, ressurge aqui como presença fecunda de um amor sem limites.
Como culminância das atividades, os jovens filósofos produziram textos dissertativos procurando envolver o tema estudado com o filme apresentado.

Ficha Técnica:

Título Original: La Vita è Bella
Gênero: Comédia Dramática
Tempo de Duração: 116 minutos
Ano de Lançamento (Itália): 1997
Direção: Roberto Benigni
Roteiro: Vincenzo Cerami e Roberto Benigni
Produção: Gianluigi Braschi e Elda Ferri
Música: Nicola Piovani
Direção de Fotografia: Torino Delli Colli
Desenho de Produção: Danilo Donati
Direção de Arte: Danilo Donati
Figurino: Danilo Donati
Edição: Simona Paggi

Elenco: Roberto Benigni (Guido Orefice), Nicoletta Braschi (Dora), Giorgio Cantarini (Giosué Orefice), Giustino Durano (Tio de Guido), Sergio Bini Bustric (Ferruccio Papini), Marisa Paredes (Mãe de Dora), Horst Buchholz (Dr. Lessing), Amerigo Fontani (Rodolfo), Pietro De Silva (Bartolomeo), Francesco Guzzo (Vittorino).

Sinopse: Na Itália dos anos 40, Guido (Roberto Benigni) é levado para um campo de concentração nazista e tem que usar sua imaginação para fazer seu pequeno filho acreditar que estão participando de uma grande brincadeira, com o intuito de protegê-lo do terror e da violência que os cercam.

Abraços fraternos a todos os amigos e amigas da sabedoria,
Jorge Leão

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Para os jovens do corpo e da alma

Um texto para os que se fazem jovens sempre, a lembrar da beleza da eterna juventude enquanto corpo e alma somos e estamos...
abraços fraternos,
Jorge Leão
Para os jovens do corpo e da alma

Ficamos aturdidos quando o tempo nos impõe seus limites. Mesmo sem compreender o porquê dos acontecimentos, reconhecemos que somos mortais. Resta-nos então a espera da poeira que baixa, quando a casa festivamente aguarda a chegada de mais um aniversário.

Do mesmo modo, o sorriso deixado pelo amigo que se foi. As lembranças guardadas no baú da saudade. Estes são, de fato, os fatos que se transformam em versos de amor, e abrandam o sentimento de incompletude deixado pela inexorável passagem do tempo.

E o que dizer de nosso corpo, que se perde como as folhas secas do outono? O sereno cuidado dos braços maternos, segredo incontido dos tempos de infância, acaba por desnudar a alma da mais pura beleza da vida. É quando descobrimos que ganhamos e perdemos muitas coisas na vida...

O mistério de um abraço apertado, o doce segredo da primeira paixão, o chocolate escondido atrás da poltrona da sala, os pés sujos de lama, os cabelos molhados depois de um inesquecível banho de chuva, a ansiedade para amanhecer no dia de Natal e abrir os presentes, a vela acesa na sala quando a energia da casa faltava, o cheiro da terra depois da noite chuvosa. Esses são momentos de fecundidade, que traduzem nosso pertencimento ao perene estado de ser jovem.

Ser jovem... Um jovem de vinte e poucos anos, ou mesmo um com os seus cinqüenta, ou quando a juventude aflora em sua magnitude aos oitenta. Não importa o período, o número, a extensão, a medida. O que vale mesmo é a saudade. Por isso, é bom lembrar vivamente o passado presente e esquecer o futuro. O passado não presente precisa ser mesmo passado, e esquecido, pois desprovido de vida.

Os tempos gramaticais pouco contam aqui, quando o que nos mantém vivos é a umidade da terra, prenhe de sinais fecundos, aptos para mais uma primavera chegando. Muitos jovens do corpo envelhecem antes do tempo, pois não têm tempo de ter saudade. São os tempos modernos, dizem os especialistas.

Embora reconhecendo a velocidade do ritmo urbano que nos consome, é possível ainda ouvir alguns sons divinos, é quando sobrevivem no fundo da terra os segredos inesgotáveis dos que se fazem jovens da alma. Talvez o encantamento divinal mais plausível seja o som da eterna juventude que bombeia nossos corações, levando para o corpo a vitalidade cristalina de uma voz milenar, a nos dizer: “viva intensamente cada momento de cada dia”...

Talvez resida aí o segredo do envelhecimento natural. E a irresistível vontade de buscar a fonte de água pura, nas montanhas preciosas da liberdade pelo amor. Quando perguntaram a um mestre iluminado como fazer para alcançar a sabedoria, ele respondeu: “respire profundamente e sentirás a energia da vida, assim terás a sabedoria como companheira”.

Ou seja, o grande mistério da felicidade reside nas coisas mais simples, mais singelas, lavadas com a água da verdade e com o perfume da sinceridade. Pior caminho é esquecer de caminhar. Pior veneno é não amar.

Melhor então é respirar com consciência e ouvir a incansável sinfonia da natureza. Já podemos cantar o hino da felicidade, pois o segredo da eterna juventude reside dentro de nós mesmos. Qualquer busca será em vão, se esquecermos de viajarmos para dentro de nós mesmos. Nesta viagem embarcam os jovens do corpo e da alma, eternos habitantes do reino das graças de Deus.

Jorge Leão
09 de janeiro de 2009

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Roteiro para avaliação por meio de Seminário

Apresento aqui um breve roteiro para trabalhar com avaliação por meio de um Seminário...

Roteiro para atividade com Seminário

1 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA DOS CONTEÚDOS
(o professor deve expor a fundamentação teórica nas aulas expositivas)

2 - PROBLEMATIZAÇÃO
(aqui o professor poderá trazer questões relativas a uma possível aplicação dos conteúdos com questões contemporâneas, ou ainda trazendo um texto, um filme, ou uma dinâmica de grupo para ilustrar o que foi fundamentado, e isso para qualquer disciplina)

3 - DIVISÃO DA TURMA
(poderá ser feita conforme o número de alunos por sala, o correto é não passar de seis alunos por equipe)

4 - O ROTEIRO DA APRESENTAÇÃO
(o professor deve frisar a importância do grupo trabalhar os problemas em conjunto, evitando com isso a fragmentação em partes, cada aluno "decorando" a sua, e perdendo de vista o todo, e as demais equipes, inclusive; isso dependerá muito de como o professor fundamentou o conteúdo, pois se sua visão também for fragmentada, a tendência será os alunos reproduzirem esse modelo reducionista)

5 - A AVALIAÇÃO DO SEMINÁRIO
( o professor deve propor que as equipes, depois de suas apresentações, socializem na escola os resultados dos trabalhos por meio de uma exposição no pátio, indicando possíveis soluções para os problemas levantados no estudo).

Bem, penso que esses são pontos fundamentais para o desenvolvimento de um bom seminário,

abraços,
Jorge Leão